sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Um cirurgião no Calvário



O Dr. Pierre Barbet, Cirurgião do Hospital São José (Paris), descreveu os sofrimentos de Nosso Senhor na Crucifixão, após o estudo das impressões no Santo Sudário.

A crucifixão começa. Os verdugos conhecem seu ofício. Começarão por desnudá-lo. O manto superior não apresentará nenhuma dificuldade, mas a túnica aderiu intimamente às chagas, pegou a todo o seu corpo, e esta retirada é simplesmente atroz. Você já tirou alguma vez uma atadura de uma ferida já seca? Você já teve que sofrer esta operação, que muitas vezes exige anestesia? Se é assim, então poderá entender algo do ocorrido a Cristo.

Cada fio da lã se tornou uma só coisa com a superfície do corpo e arrancá-los traz consigo inumeráveis terminações nervosas, deixadas ao ar na ferida. Estes milhares de choques dolorosos multiplicam-se, aumentando cada um a sensibilidade externa do sistema nervoso. Não se trata de uma lesão local, senão de quase toda a superfície do corpo e, sobretudo, de suas costas dilaceradas.

Os verdugos, apressados, procedem grosseiramente. Talvez assim seja melhor. Mas, como essa dor aguda, atroz, não lhe produz uma síncope?

Os verdugos medem a perfuração para abrir os orifícios aos cravos e a horrível operação começa. Um dos ajudantes puxa um dos braços com a palma para cima. O verdugo toma o cravo (um longo cravo pontiagudo, que na parte próxima à cabeça mede quase 1 cm), apóia-o sobre o pulso, na fenda que ele conhece bem. Um só golpe de seu pesado martelo e o cravo entrou na madeira. Dois golpes mais e ficará bem preso.



Jesus não gritou mas seu rosto se contraiu horrivelmente. Seu polegar com um movimento violento, nervoso, enterrou-se na palma: seu nervo mediano tinha sido ferido. Uma dor inenarrável, lacerante, que se alastrou por seus dedos, correu como uma flecha de fogo até seu ombro e prorrompeu no cérebro. É a dor mais insuportável para um homem, aquele que provém do corte dos grandes centros nervosos. Quase sempre traz consigo a síncope. Jesus não quis perder o conhecimento. Se ao menos o nervo tivesse sido todo cortado! Mas não, só foi destruído em parte. A ferida do feixe de nervos está roçando no cravo e sobre ele, em seguida quando for suspenso o corpo, será terrivelmente estendido, como se estende uma corda de violino sobre sua ponte. Vibrará a cada sacudida, a cada movimento, renovando a dor horrível. E isso durante três horas.

Estendem-lhe o outro braço; os mesmos gestos se repetem, as mesmas dores. Mas desta vez, Jesus já sabe o que lhe espera, acaba de experimentar na outra mão. Já está cravado no patíbulo (o travessão horizontal da cruz), ao que se adaptam seus dois ombros e seus dois braços. Já tem forma de cruz.

Tem que ficar de pé. O verdugo e seu ajudante sustentam as pontas do patíbulo e endireitam o condenado. Fazem-no retroceder, apóiam-no à viga, desgarrando suas mãos perfuradas (ai de seus nervos médios!). Com um último esforço, pois a viga não está muito alta, rápido porque pesa, engancham com certeira manobra o patíbulo no alto da viga.

O corpo pendurado pelos braços, que se estendem obliquamente, é agoviante. Os ombros feridos pelos açoites e o peso da cruz, rasparam dolorosamente na madeira áspera. A nuca que sobrepassa o patíbulo, golpeou contra ele ao passar, para terminar apoiando-se no alto da viga. As pontas afiladas do grande capacete de espinhos dilacerou o crânio ainda mais profundamente. Sua pobre cabeça pende para diante, pois a espessura da coroa lhe impede repousar sobre a madeira; e cada vez que a endireita renova suas perfurações.

O corpo pendente não está sustentado mais que pelos dois cravos fincados nos dois carpos (ai dos nervos médios!). Poderia ficar assim. O corpo não se inclinará adiante, mas o costume é fixar também os pés. O pé esquerdo plano sobre a cruz. De um só golpe de martelo, o cravo afunda no meio (entre o segundo e o terceiro metatarsos). O ajudante endireita o outro joelho e o verdugo, aproximando o pé direito sobre o esquerdo, que o ajudante mantém plano, com um segundo golpe no mesmo lugar, perfura este pé. Logo com fortes pancadas, o cravo penetra na madeira. Aqui, o suplício não fez mais que começar.

Jesus a princípio sentiu algum alívio. Depois de tantas torturas, para um corpo esgotado, essa imobilidade foi quase um descanso, que coincidiu com uma baixa do seu tono vital.

Mas tem sede. Até agora não a tinha manifestado. Rejeitou a bebida calmante, preparada pelas caridosas mulheres de Jerusalém. Seu sofrimento o quer completo. Tem sede: nada bebeu nem comeu desde o entardecer anterior. E estamos ao meio-dia. Uma boa alma entre os soldados, ocultando sua compaixão, molhando uma esponja em seu vinho acidificado, “vinagre”, dizem os Evangelistas, apresenta-lhe na ponta de uma vara. Tomará ao menos uma gota? Qualquer bebida significa para um torturado uma síncope mortal. Dominará sua sede? Morrerá em sua hora; falta-lhe a fala por duas ou três vezes.

Logo se produz um fenômeno estranho. Os músculos de seus braços ficam rígidos, em uma contração que aumenta por espasmos. Seus deltóides, seus bícepes distendidos, são marcados na pele dilacerada. Seus dedos se curvam como garfos. Cãibras! Você já experimentou essa dor aguda e crescente, em uma perna, entre as costelas, em qualquer parte do corpo?

Agora as coxas e as pernas mostram esses traços rígidos. Os dedos dos pés se curvam, como numa dessas terríveis crises que jamais se esquece. Há generalização das cãibras em todo o corpo. Começa pelos músculos do ventre, logo os intercostais, os do pescoço, por fim os respiratórios.

Sua respiração vai ficando cada vez mais curta, mais superficial. A tensão muscular duplicou nas costelas já levantadas pela contração dos braços. O ar entra silvando, mas já quase não sai. Respira ansiosamente, inspira um pouco, mas já não pode inspirar mais. Tem falta de ar (está como os asmáticos nos momentos mais agudos do ataque).

Seu rosto pálido enrubesceu pouco a pouco, passou a púrpura, ao violeta, por fim ao azul. Se asfixia. Seus pulmões repletos de ar não podem esvaziar-se. Sua testa está coberta de suor. Seus olhos desorbitados mexem em sangue. Que dor horrível deve martelar seu crânio! Vai morrer.

Lentamente, com um esforço sobrehumano se apoiou sobre o cravo dos pés. Sim, sobre suas chagas e os joelhos se estendem pouco a pouco e o corpo se levanta devagar, aliviando a tensão dos braços.
Então, começa a ceder o terrível fenômeno. A cãibra diminui. Os músculos se afrouxam, ao menos os do peito. A respiração se faz mais fácil e profunda; os pulmões se renovam, em seguida o rosto adquire sua palidez de antes.

E para que todo esse esforço? Cristo nos vai falar: “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem”. Perdoa a nós, seus verdugos. Mas seu corpo novamente baixa. A cãibra começa de novo... E cada vez que fala (sete palavras conservamos) e cada vez que quer respirar, tem que apoiar-se novamente sobre o cravo de seus pés.

E cada movimento repercute em suas mãos, com dores atrozes. É a asfixia periódica que sente uma pessoa estrangulada e logo volta à vida, para sufocar-se uma e outra vez. Cristo não pode escapar desta asfixia senão ao custo de dores horríveis. E isto vai durar três horas!

Todas as suas chagas estão infectadas. Delas sai uma linfa clara e transparente.

Jesus segue lutando; de vez em quando se ergue. Todas as suas dores, sua sede, suas cãibras, a asfixia e as vibrações de seus dois nervos médios.

Por fim, em um supremo esforço, endireita-se por última vez e dando um grito, exclama: “Pai, em tuas mãos entrego meu Espírito”.

(Quando o Papa Pio XII escutou do Dr. Pierre Barbet a explicação médica do padecimento de Cristo na Cruz, empalideceu de angústia.)

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